Proposta indecorosa dos representantes dos auditores federais contra o CARF

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) – atual denominação do quase centenário Conselho de Contribuintes – é o órgão que analisa, em segunda instância administrativa, as defesas dos contribuintes (pessoas físicas e jurídicas) apresentadas em face dos autos de infração lavrados pelo Fisco Federal.

São raras as vezes em que o Fisco não abusa, de forma exagerada, nas acusações fiscais. Isto justifica a defesa dos contribuintes por um colegiado técnico e paritário, composto tanto por representantes do Fisco – auditores fiscais em geral –, como por representantes dos contribuintes – advogados tributaristas, na maioria dos casos.

Por ser um órgão de revisão do lançamento tributário, e também por ser um órgão paritário, o CARF vem produzindo justiça fiscal, mesmo diante da esmagadora maioria de casos em que as autuações fiscais são mantidas. Estatísticas da própria Receita Federal já mostraram que 95,8% das autuações fiscais julgadas foram mantidas pelo CARF.

Já se tornou comum a lavratura de vários autos de infração contra o mesmo contribuinte, como resultado de uma mesma ação fiscal. Ou seja: inicia-se um trabalho de fiscalização (com um ou mais agentes do Fisco) e, no mesmo ato, são desenvolvidas várias atividades diferentes, assim ensejando diversos autos de infração. Isto não porque os contribuintes estejam errados, mas por razões muito simples: não se analisa a inconstitucionalidade de leis (papel do Poder Judiciário) e, também, porque a autoridade administrativa que proceder ou presidir a quaisquer diligências de fiscalização lavrará os termos necessários para que se documente o início do procedimento, na forma da legislação aplicável, que fixará prazo máximo para a conclusão.

Os trabalhos de fiscalização devem ser concluídos em um prazo máximo fixado pela autoridade fazendária, pois o contribuinte não pode ficar indefinidamente à espera do resultado. Isso decorre do princípio da eficiência, contido no artigo 37 da Constituição Federal.

Deixar os autos de infração serem lavrados sem uma instância paritária que promova sua revisão é conferir ao Fisco um poder absoluto, que contrasta com todo o nosso sistema jurídico.

É preciso, portanto, aperfeiçoar os tribunais administrativos brasileiros. A oportunidade para fazer uma reforma não poderia ser melhor.

Para transformar um Estado do mais baixo barbarismo ao mais alto grau de opulência, será necessária uma tributação leve, dentro de uma tolerável administração de Justiça, sem o discurso confiscatório apoiado em uma proposta para dizimar um órgão da importância do CARF (que representa “justiça fiscal” e garantia constitucional contra as aberrações praticadas pelos auditores junto aos contribuintes).

É justamente por essa razão que nos preocupam as declarações publicadas no jornal Valor Econômico em 5 de fevereiro. Nelas, o dissimulado presidente do Sindifisco Nacional propôs, ao Ministro Paulo Guedes, o aumento arrecadatório com a extinção do CARF, usando de argumentos espúrios em relação a esse tribunal administrativo*. Ora, nada mais despropositado, na medida em que o CARF é o próprio órgão de controle e de revisão dos autos de infração lavrados pelo Fisco Federal!

Por mais valorosos que sejam os trabalhos das chamadas Delegacias da Receita Federal de Julgamento (que julgam, em primeira instância administrativa, as autuações fiscais federais), sua composição exclusiva por auditores fiscais, seus julgamentos a portas fechadas e sua notória parcialidade em razão de sua própria composição não permitem um controle externo da Receita Federal – trabalho este que, desde 1924, vinha sendo realizado pelo então Conselho de Contribuintes e, agora, é feito pelo CARF.

Propor a extinção do CARF sob essa ótica é uma medida que, ao que tudo indica, só interessaria à própria Receita Federal, que deixaria de sofrer controle externo e passaria a figurar como um superpoder – apenas censurável pelo já tão sobrecarregado Poder Judiciário. O CARF e a justiça fiscal são maiores do que episódios pontuais e lamentáveis, os quais, de toda forma, merecem a devida e serena apuração.

Entendemos que o modelo atual possa até merecer aperfeiçoamento, contudo, jamais extinção. As regras tributárias são muito específicas e exigem um conhecimento técnico muito profundo; atualização constante e apreciação detida de provas, contabilidade, laudos fiscais etc.

Por vigorar no processo administrativo o princípio da verdade material, muitos formalismos e ritos exigidos no Poder Judiciário são postos de lado, permitindo que o contribuinte efetivamente exerça seu direito de defesa.

Por tais razões, não podemos validamente admitir essa “proposta” indecorosa dos senhores auditores federais para extinção do tribunal administrativo brasileiro, mas sobretudo em respeito à ordem do artigo 5º da Constituição Federal, que trata da duração razoável do processo o “dever” de julgar a favor do Fisco mesmo contra as próprias convicções, a lei e a prova dos autos.

*Curiosamente, no mesmo dia em que a intenção se tornou pública, o Sindifisco afirmou que a proposta enviada ao ministro da Economia, Paulo Guedes, jamais pretendeu extinguir a 2ª instância de julgamento, nem, muito menos, a via administrativa como meio de solução de controvérsias. Segundo a entidade sindical, o que se propõe é a supressão de uma das instâncias do Carf.

Luiz Ramos – Presidente do SINDICOMIS/ACTC

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