Câmara aprova MP que altera tributação de empresas em negócios com o exterior

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (30) a Medida Provisória 1152/22, que muda regras para fixação de preços usados em transações entre empresas relacionadas a fim de adequar as normas nacionais às praticadas pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e evitar práticas destinadas a diminuir o pagamento de tributos. A MP será enviada ao Senado.

Editada no fim do governo Bolsonaro, a MP foi aprovada na forma de um substitutivo do relator, deputado Da Vitoria (PP-ES), que mudou principalmente aspectos relacionados aos preços de commodities e de envio de royalties.

As novas regras terão vigência a partir de 1º de janeiro de 2024, mas o contribuinte interessado poderá optar por aplicá-las a partir de 1º de janeiro de 2023.

Segundo a exposição de motivos da MP, este seria o caso de multinacionais dos Estados Unidos que, devido a mudanças na legislação daquele país em janeiro de 2022, ao fazer essa opção poderiam voltar a contar com a dedução, no imposto a pagar pela matriz, do imposto pago pelas empresas relacionadas e cobrado no Brasil.

A condição para a continuidade desse benefício nos Estados Unidos é que as transações sejam feitas com países que adotem as regras agora propostas pela MP. Segundo a Fazenda, isso poderia manter ou aumentar os investimentos no Brasil.

Outro argumento para a mudança é o preparo da legislação brasileira para dar continuidade ao processo de ingresso do País na OCDE, que exige a uniformização de procedimentos dessa natureza.

Paraíso fiscal
O texto também diminui de 20% para 17% a alíquota de imposto sobre a renda abaixo da qual o país é considerado paraíso fiscal.

A justificativa é de que a maior parte dos países diminuiu as alíquotas de tributos sobre a renda de 2000 a 2020, perfazendo, no caso da OCDE, uma alíquota média de 23,9%.

A manutenção de renda tributável em paraíso fiscal implica a perda de “benefícios” da legislação tributária, como dedução de juros em caso de endividamento superior a 30% do patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil e impossibilidade de contar com tratamento tributário incentivado (isenção de ganho de capital) para investimentos de não residentes em bolsa de valores e assemelhados.

Princípio
A MP estabelece critérios para que as transações entre as empresas jurídicas domiciliadas no Brasil e outras empresas relacionadas a elas no exterior sigam os mesmos termos e condições de transações que seriam feitas com empresas não relacionadas (terceiros).

Chamado pelo termo em inglês de princípio Arm’s Length, esse conceito tenta evitar que as empresas usem brechas atuais na legislação para fazer um planejamento tributário a fim de pagar menos imposto.

Devido ao tributo sobre a renda ser menor em outros países (como Áustria ou Suíça, onde é de 20%), empresas sediadas no Brasil vendem seus produtos a empresas relacionadas com sede nesses países a um preço próximo do custo.

Essas empresas no exterior então vendem o produto ao destinatário final e podem contar ainda com benefícios locais ou prejuízo acumulado para descontar o imposto a pagar nesses países, incidente sobre o lucro da operação de revenda.

Adicionalmente, no Brasil, quando da incorporação do lucro obtido na venda final, a diferença de imposto a pagar (34% da carga tributária brasileira menos os 20% do país no exterior) também pode ser reduzida com incentivos regionais existentes e a isenção no pagamento de juros sobre capital próprio, levando até mesmo a zerar o imposto.

Partes relacionadas
Essas transações são conhecidas como transações controladas, pois não derivam de negociações com empresas independentes totalmente, que seguiriam critérios de competitividade no estabelecimento do preço.

Como a venda afeta a receita bruta, os impostos envolvidos nas novas regras são o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

A MP amplia o conceito de empresas que podem ser consideradas uma parte relacionada nesse tipo de transação, retirando da legislação o termo “empresa vinculada”, que apresenta restrições devido à variedade de arranjos de negócios atualmente existente.

Assim, nesse conceito, além dos casos mais claros de controle acionário – direto ou indireto, controladores parentes ou participações mínimas em lucros – o texto engloba ainda acordos de votos para controlar deliberações sociais, por exemplo. Isso tudo vale para qualquer entidade (pessoa natural ou jurídica e outros arranjos contratuais ou legais).

Comparação
Para determinar o preço desse tipo de transação que vai impactar no valor de receita obtida passível de tributação, a empresa deve adotar os critérios listados usando termos do contrato da transação, características dos bens ou direitos negociados, circunstâncias econômicas das partes e do mercado em que operam e estratégias de negócios, entre outros itens.

Em qualquer situação, devem ser consideradas as opções realisticamente disponíveis para a realização da transação como se ela pudesse ser feita com uma parte não relacionada.

Após a adoção de todos os parâmetros, a transação deve ser comparada com transação de igual tipo que seria possível de ocorrer com empresa não relacionada a fim de garantir a aplicação do princípio definido (Arm’s Length).

O principal método para determinação do preço a ser considerado de modo geral é o que compara o preço pago com aquele de transações semelhantes entre partes não relacionadas, conhecido como Preço Independente Comparável (PIC).

A adoção de outros métodos deverá ser justificada pela empresa, ao contrário de como ocorre hoje.

Commodities
Em relação às commodities, os principais produtos exportados pelo Brasil (grãos e minérios, por exemplo), o PIC será aplicado quando informações confiáveis de preços independentes estiverem disponíveis, incluindo preços de cotação publicados por bolsas e os índices divulgados por agências de preços.

Nesse tópico, o deputado Da Vitoria propôs que também possam ser usados os preços praticados com partes não relacionadas, inclusive preços públicos, exceto em condições extraordinárias de mercado que levem a um resultado incompatível com o princípio postulado na MP.

Para outro método poder ser aplicado, o texto aprovado pela Câmara permite que sejam levados em conta outros fatores como os ativos, as funções e os riscos de cada entidade na cadeia de valor.

Método alternativo listado na MP poderá ser aplicado também quando a confiabilidade do PIC seja afetada a ponto de justificar método diferente, mesmo após ajustes para se chegar a um preço comparável entre transações controladas e não controladas.

Ajustes
Devido à complexidade de vários tipos de operações, a MP 1152/22 permite ao contribuinte realizar ajuste espontâneo na base de cálculo dos tributos quando ela for inferior à que seria calculada em transações entre partes não relacionadas. Poderá ser feito também um ajuste compensatório até o encerramento do ano-calendário.

Esses ajustes não podem reduzir a base de cálculo encontrada ou aumentar o valor do prejuízo fiscal do IRPJ ou a base de cálculo negativa da CSLL, exceto se realizados na forma e no prazo estipulados pela Receita Federal no âmbito de mecanismos de solução de disputa previstos em acordos ou convenções internacionais para eliminar dupla tributação.

Caso o contribuinte não faça nenhum desses ajustes quando necessário, o fiscal da Receita fará o ajuste primário de ofício, adicionando o valor à base de cálculo.

Juros tributáveis
Outra mudança no texto incluída pelo relator exclui o chamado ajuste secundário, previsto para lidar com as consequências da transferência indevida de lucros para outras jurisdições por causa da base de cálculo errônea.

Essas consequências ocorrem porque, apesar de haver uma correção da alocação dos lucros para fins tributários, isso não muda o fato de que o lucro transferido permanece localizado e registrado em outro país.

Pelo texto original da MP, esse montante seria considerado crédito concedido às partes relacionadas envolvidas na transação e remunerado à taxa de juros de 12% ao ano. Esses juros deveriam ser somados à base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Se o contribuinte optasse por repatriar o valor, os juros não seriam tributados.

“A figura do ajuste secundário acaba tendo a natureza de um ajuste punitivo ao contribuinte”, afirmou o relator.

(Agência Câmara de Notícias)

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