MPF denuncia presidente do CNI e outros 9 por suspeita de desvios no sistema S

O Ministério Público Federal denunciou, nesta segunda-feira (10/8), dez pessoas investigadas por desvio de mais de R$ 2,5 milhões do Serviço Social da Indústria (Sesi). Entre os denunciados estão Robson Braga de Andrade, atual presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

A investigação abrange um contrato de patrocínio do projeto Relix Pernambuco 2014, firmado entre o Departamento Regional do Sesi no estado e o Instituto Origami.

Relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU) identificaram fraudes ocorridas em processos seletivos e contratos administrativos firmados por diversos departamentos do Sesi e do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), segundo o MPF.

De acordo com as apurações, as irregularidades ocorreram em seleções e contratos envolvendo o grupo empresarial da Aliança Comunicação e Cultura Ltda, contratada inicialmente por inexigibilidade de licitação de forma indevida e, posteriormente, por meio da contratação indireta de seus projetos mediante a cooptação de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips).

Relatório do TCU apontou que, entre 2010 e 2017, houve o aporte de mais de R$ 260 milhões por parte do Sesi nos projetos. No entanto, o volume de contratos com os Departamentos Regionais do Sesi de Pernambuco, Paraíba, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Alagoas superaram em muito a média nacional. Somando esses valores às contratações firmadas com o Sesi entre 2002 e 2009 e os convênios com o Ministério do Turismo pactuados pela Oscip Instituto Mundial de Desenvolvimento da Cidadania (IMDC), que tiveram como principal executora a empresa Aliança Comunicação e Cultura Ltda., os contratos ultrapassam R$ 400 milhões.

Acusações
Segundo o MPF, Robson Braga de Andrade, atual presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), e à época diretor do Departamento Nacional do Sesi; Ricardo Essinger, então diretor Regional do Sesi em Pernambuco; e Ernane Aguiar Gomes, então superintendente do Sesi no estado, realizaram a liberação dos recursos do Relix Pernambuco 2014 sem nenhum tipo de avaliação financeira, pesquisa de mercado ou acompanhamento da execução orçamentária e financeira do projeto, possibilitando o enriquecimento ilícito de terceiros às custas de verba do Sistema S.

O MPF ainda afirma que os denunciados Hebron Costa Cruz de Oliveira e Romero Neves Silveira Souza Filho, respectivamente presidente e diretor sociocultural do Instituto Origami, uma das Oscips cooptadas no esquema, utilizaram empresas de “fachada” e pagamentos por serviços não realizados na execução do Relix. As investigações ainda apontaram que a Aliança Comunicação e Cultura Ltda., cujos sócios são os irmãos Luiz Otávio Gomes Vieira da Silva e Lina Rosa Gomes Vieira da Silva, também denunciados pelo MPF, foi a principal destinatária dos recursos alocados no projeto, que foram repassados mediante a emissão de notas fiscais faturadas pela Aliança em favor do Instituto Origami.

Também consta na denúncia que uma parcela dos serviços referentes ao contrato de patrocínio firmado entre o Sesi e o Instituto Origami foi viabilizada mediante contratações realizadas por intermédio da empresa Alto Impacto Entretenimento Ltda., sob a gestão do também denunciado Luiz Antônio Gomes Vieira da Silva, irmão de Luiz Otávio Gomes Vieira da Silva e de Lina Rosa Gomes Vieira da Silva. Nessa contratação, foi detectado sobrepreço e consequente superfaturamento referente ao valor contratado pelo Sesi.

O MPF destaca ainda que, segundo as apurações, os irmãos Luiz Otávio Gomes Vieira da Silva e Lina Rosa Gomes Vieira da Silva utilizaram, de forma deliberada, empresas para fins de difusão e consequente desvio dos recursos destinados à execução do Relix Pernambuco 2014, sob a forma de “taxa de administração” que seria cobrada por essas empresas — é o caso da Idea Locação de Estruturas e Iluminação, que, à época, estava sob o comando do denunciado Júlio Ricardo Rodrigues Neves.

Também é alvo da denúncia o então secretário estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade, Sérgio Luís de Carvalho Xavier, apontado como articulador para a implantação do Relix em Pernambuco, tendo sido o responsável por apresentar o projeto ao Sesi. Segundo o MPF, foi constatado que pessoa jurídica controlada pelo ex-secretário (SX Brasil Comunicação Digital Ltda.) foi subcontratada pela Aliança Comunicação e Cultura para o desenvolvimento de aplicativo do Relix, que as apurações indicaram ter sido realizado por outra empresa.

Caso sejam condenados pela Justiça Federal pela prática do crime de peculato, a pena aos denunciados pode chegar a 12 anos de reclusão, além do pagamento de multa. O MPF também requer que seja decretada perda de eventual cargo ou função pública exercida pelos envolvidos, bem como a perda de bens acrescidos ao patrimônio em decorrência da prática criminosa e a reparação dos danos causados aos cofres públicos.

STJ
O Superior Tribunal de Justiça, em decisão de 3 de agosto de 2020, negou recurso em habeas corpus interposto por Luiz Otávio Gomes Vieira, Luiz Antônio Gomes Vieira da Silva e Lina Rosa Gomes Vieira da Silva, ratificando acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região e confirmando a competência da Justiça Federal para processar o caso.

Entidades
O MPF ainda analisa pelo menos nove projetos financiados pelos departamentos do Sesi, além dos convênios celebrados diretamente entre a União, por meio do Ministério do Turismo, e as entidades sem fins lucrativos investigadas. As Oscips (Instituto Mundial de Desenvolvimento da Cidadania – IMDC, Instituto Origami e Instituto de Produção Socioeducativo Cultural Brasileiro – IPCB) foram contratadas pelos departamentos do Sesi, mas subcontrataram a Aliança para a execução dos objetos celebrados.

“Em síntese, o Ministério do Turismo e os diretórios do Sesi contratavam as Oscips, que terceirizavam a execução dos projetos à Aliança Comunicação e Cultura Ltda., sob a alegação de que esta é quem detém os direitos autorais dos projetos, mas se constatou ao final que, em tese, os valores dos projetos eram muito superiores ao efetivamente gasto com as suas produções e que boa parcela dos recursos foi desviada a empresas fantasmas ou a outras ligadas ao grupo que administra a Aliança Comunicação e Cultura Ltda, para beneficiar esta última ou seus administradores”, destaca a procuradora. Com informações da assessoria de imprensa do MPF.

Em nota, Sesi e CNI comentaram o caso:

“A propósito da referida denúncia, é importante esclarecer que a mesma foi oferecida pelo Ministério Público Federal de Pernambuco em abril de 2020, no âmbito da Operação Fantoche.  E, também, que a atribuição do Ministério Público Federal, e da própria Justiça Federal, para apresentar denúncia neste processo ainda estão em discussão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O Departamento Nacional do Serviço Social da Indústria (Sesi) informa que o auxílio financeiro que concedeu ao Departamento Regional do Sesi de Pernambuco, para que este patrocinasse o Projeto Relix — que tem por objetivo a realização de ações educativas e culturais junto a alunos e trabalhadores, voltadas para a reciclagem de lixo —  seguiu rigorosamente os trâmites e os controles da instituição, além de ter sido fiscalizado e certificado por auditorias externas e demais órgãos de controle.

O Departamento Nacional do Sesi esclarece, ainda, que forneceu toda a documentação requerida pelas autoridades competentes, e que seu diretor, Robson Braga de Andrade, prestou todos os esclarecimentos à Justiça.

A instituição continua trabalhando no aperfeiçoamento de seus mecanismos de controle e de conformidade, que inclui um amplo programa de compliance, e permanece à disposição para prestar à Justiça os esclarecimentos complementares que se fizerem necessários.”

A Aliança Comunicação também comentou o caso:

“A Aliança Comunicação e Cultura Ltda., através do escritório de advocacia Rigueira, Amorim, Caribé, Caúla & Leitão, esclarece que há 57 anos atende clientes públicos e privados em todos os estados da federação brasileira. Nas duas últimas décadas, a idealização, criação, curadoria, produção e direção de projetos de democratização do acesso à cultura, aos direitos humanos e à preservação do meio-ambiente, alcançou 10 milhões de brasileiras e brasileiros presencialmente.

O Projeto Relix, voltado à educação, arte e tecnologia para a redução da produção de resíduos sólidos e potencialização da coleta seletiva, ao longo de suas 05 edições, atingiu um público de mais de 160 mil pessoas, através de 700 apresentações de teatro, exposições, instalações culturais e performances interativas em escolas públicas e privadas, espaços públicos, teatros históricos e cooperativas de catadoras e catadores, nos estados de Pernambuco, Paraíba e Alagoas.

Nos últimos 18 anos, a Controladoria Geral da União auditou e aprovou todas as prestações de contas da Aliança Comunicação nos projetos executados junto ao SESI, sem apontar inexecução ou dano ao erário. Da mesma forma, todos os projetos tiveram suas contas aprovadas pelo Tribunal de Contas da União. Além disso, no trâmite de captação de patrocínios através da Lei de Incentivo à Cultura, o Projeto Relix passou por criteriosa análise técnico-financeira do Ministério da Cultura.

Dito isso, a empresa rechaça veementemente as acusações veiculadas através da mídia, pois a investigação denominada pejorativamente de “Operação Fantoche” foi conduzida por autoridades sem competência jurisdicional e resultou em denúncia criminal que ignora as formalidades legais inerentes aos contratos privados entre o Sistema S e a Aliança Comunicação e Cultura e todas as decisões anteriores do Tribunal de Contas da União.”

(ConJur)

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