Com as novas regras de tributação para importações acima de US$ 50, os freight forwarders – também conhecidos como agentes de carga ou transitários – podem vir a ser os responsáveis pela retenção e repasse dos impostos dessas transações. A proposta, de autoria do presidente do SINDICOMIS/ACTC, Luiz Ramos, já é de conhecimento de ministros e de outras autoridades em Brasília (DF).
Durante o evento SICOMÉRCIO 2023, que ocorreu entre 11 e 14 de julho, Ramos abordou novamente o tema com as autoridades. “Isto poderá ser implementado via normativa, ou seja, não será preciso um projeto de lei. Já deixamos claro ao governo que as empresas que atuam como freight forwarders no Brasil estão qualificadas e possuem plenas condições operacionais e tecnológicas para atuar dessa forma nas operações de e-commerce”, explicou.
Ramos já discutiu o assunto com os ministros Márcio França (Portos e Aeroportos) e Geraldo Alckmin (MDIC e vice-presidente da República); Marcela Carvalho, secretária-executiva da Câmara de Comércio Exterior; Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do MDIC; Andrea Macera, secretária de Competitividade e Política Regulatória do MDIC; Jackson Aluir Corbari, subsecretário de Administração Aduaneira, entre outros.
As novas regras de tributação para compras internacionais acenderam um alerta no varejo brasileiro e nos consumidores. Além dos 60% do imposto de importação federal, as autoridades fiscais estaduais anunciaram que haverá incidência do ICMS nas compras internacionais acima de US$ 50.
Entenda o contexto
(fonte: Folha de S. Paulo)
Conforme anunciado pelo Comitê Nacional de Secretários de Fazenda (CONFAZ) em 2 de junho, a alíquota será estabelecida em 17%. Antes, o percentual variava em cada unidade federativa.
Além disso, surge a preocupação com uma possível cobrança de imposto sobre imposto. Os itens poderiam sofrer aplicação do ICMS estadual sobre o preço já tributado pela União, pesando ainda mais no bolso dos consumidores.
Por outro lado, o varejo brasileiro expressa preocupação. Representantes das empresas nacionais reclamam da isenção fiscal concedida pelo Ministério da Fazenda para as empresas estrangeiras em casos de compras abaixo de US$ 50. A apreensão das companhias é que a medida possa prejudicar a competitividade do mercado interno.
A isenção no Imposto de Importação nessas situações foi anunciada após a publicação da Portaria 612/2023, assinada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Vale ressaltar que essa isenção vale para envios feitos tanto por empresas quanto por pessoas físicas.
A isenção do tributo federal nas remessas de baixo valor é a principal estratégia do governo para conseguir a adesão das companhias estrangeiras ao programa Remessa Conforme, que visa incentivar as plataformas a declarar a importação e pagamento dos tributos federal e estadual antes do envio das mercadorias.
A ideia é que os produtos com documentação em ordem entrem no Brasil sem a necessidade de tributação no controle aduaneiro. Nessas situações, o comprador é notificado do bloqueio da remessa e apenas após pagar o tributo, a correspondência é liberada.
Além disso, o governo também busca garantir o recolhimento dos impostos e mapear todas as transações internacionais realizadas. As regras começam a valer no dia 1º de agosto.
ICMS nas compras internacionais
O CONFAZ disse à Folha de S. Paulo que a alíquota de 17% do ICMS incidirá apenas sobre as remessas expressas importadas acima de US$ 50, já incluindo:
- preço do produto;
- frete;
- seguro;
- eventuais encargos adicionais.
Mercadorias com preço abaixo de US$ 50 seguem sem a cobrança do imposto.
O CONFAZ afirmou que a padronização da alíquota do ICMS em 17% visa assegurar a eficiência do programa de conformidade do Ministério da Fazenda e agilizar as importações. “A modernização das operações e a integração das autoridades fiscais estaduais e federais permitirá que as mercadorias ingressem no território nacional com o devido tratamento, sem necessidade de retenção”, esclareceu o comitê. Este refutou a possibilidade de tributação em cascata.
Segundo o órgão, ainda que o ICMS seja aplicado após o imposto federal, incidirá sobre a base de cálculo deste. Por exemplo, para um produto custando R$ 500, o imposto federal de 60% aumentará o preço em R$ 300. Com a adição de 17% de ICMS sobre o valor de R$ 800, R$ 163,85 serão direcionados aos cofres estaduais.
Seguindo esse exemplo, na prática, a alíquota efetiva do ICMS é de 20,48%, maior que a alíquota nominal de 17%.
Empresas brasileiras pedem por mais impostos
Em 11 de julho, o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV) expressou, em nota, preocupação com uma possível “onda de demissões e fechamento de lojas” em decorrência da portaria emitida pela Fazenda. Segundo o IDV, a isenção fiscal para compras abaixo de US$ 50 gera desigualdade.
“Enquanto uma compra realizada por plataforma digital de venda cross-border [via importação] será tributada em 17%, a indústria e o comércio brasileiros continuarão sujeitos a uma carga fiscal que varia de 80% a 130% em toda a sua cadeia produtiva e de distribuição”, declarou em comunicado.
A nota adiciona que “isso acaba incentivando o fechamento de empresas e a criação de empregos em outros países”.
O instituto comunicou que acionou os Correios e a SENACON. Ressalta-se que a entidade cobra da estatal maior fiscalização das remessas ilícitas ou fraudulentas. Quanto à secretaria, o instituto solicita maior proteção aos consumidores, que podem ser prejudicados na compra de produtos falsificados.
Conforme o IDV, estima-se que R$ 137,7 bilhões deixaram de ser recolhidos em impostos nos últimos cinco anos.
A Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) também se manifestou contrária à adoção da portaria 612/2023. Em 7 de julho, o presidente da federação, Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, entregou uma carta a Geraldo Alckmin, solicitando a revogação da portaria. O texto é assinado por entidades como o IDV, além de outras associações de indústrias.
IDEC
Para a coordenadora do Programa de Finanças do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, a discussão está sendo conduzida precipitadamente. “O imposto não é uma novidade, o novo é ele ser efetivamente cobrado”, declarou em entrevista à Folha de S. Paulo.
Amorim sugere que “poderia ser um processo gradual. Não precisaria iniciar com a tributação de 60% [do imposto federal] de imediato. O mesmo se aplica ao ICMS. Poderiam ser alíquotas progressivas. A discussão deveria ser mais bem articulada para se chegar a um equilíbrio. Este problema não é imediato e há muito a ser considerado pelos mercados.”
No entendimento da coordenadora do Idec, a aplicação da alíquota de 17% do ICMS, mesmo com o tributo sendo calculado “por dentro”, resultará em pouca mudança prática e poderá confundir o consumidor.
“O ICMS causará impacto ao consumidor e é muita informação para ser assimilada de uma só vez. Este modelo é prejudicial pois não padroniza o entendimento. Quando se trata de tributação, é necessário ser objetivo.”
A entidade também considera natural a postura das empresas brasileiras. “Não é saudável termos menos concorrência, pois isso limita as opções do consumidor. [Contudo,] não é solução as empresas pedirem proteção. O ideal é buscar equilíbrio”, argumentou a especialista.
O Idec vê de maneira positiva a tributação de mercadorias na origem proposta pelo programa Remessa Conforme. “O produto já chegando com o encargo discriminado tende a facilitar a redução do prazo de entrega. Permite um melhor controle do valor dos produtos e do recolhimento”, analisou Amorim.