Se, no passado, a ameaça ao trabalhador vinha de máquinas perigosas e ambientes tóxicos, hoje ela é invisível — mas não menos devastadora. A pressão por performance, prazos insanos, instabilidade econômica e o bombardeio constante de notificações transformaram o ambiente de trabalho em um terreno fértil para o esgotamento emocional.
A comparação pode soar forte, mas é justa: empresas que ignoram a saúde mental de seus colaboradores são como neandertais corporativos, fossilizados num modelo de gestão que já não se sustenta no século 21 e empurrando a conta para um futuro próximo (e bem caro).
Do carvão à exaustão mental
A história da relação entre trabalho e saúde é, antes de tudo, uma crônica de descaso e de evolução forçada por tragédias. Durante a Revolução Industrial, trabalhadores eram submetidos a jornadas extenuantes, sem descanso, expostos a ambientes insalubres e perigos físicos extremos.
Atualmente, isso pode parecer inaceitável ou mesmo criminoso. Contudo, àquela época, era naturalizado. Foi preciso que milhares de vidas fossem perdidas para que o Estado e a sociedade impusessem marcos regulatórios básicos.
Nos séculos 19 e 20, por exemplo, era comum que carvoeiros e operários em fábricas respirassem insumos tóxicos como se fosse parte natural do ofício. As consequências, só reconhecidas anos depois pela ciência, foram devastadoras. Apenas com estudos consistentes, pressão social e ativismo médico foi possível reconhecer e classificar essas substâncias como mortíferas — e, então, proibir a exposição sem proteção adequada.
Hoje, o risco mudou de forma. Não está mais nos pulmões, mas na mente. E tem nome: burnout, ansiedade, depressão, síndrome do pânico. Todos alimentados por culturas empresariais que normalizam o excesso, ignoram sinais de sofrimento e tratam o tema com desprezo.
A lei está chegando — mas a urgência é agora
A Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que entra em vigor no Brasil em maio de 2026, estabelece diretrizes obrigatórias para a prevenção de riscos psicossociais no trabalho. A legislação representa um avanço, mas a hora de agir é agora.
Esperar que o Estado obrigue o setor privado a proteger seus trabalhadores mentalmente revela um tipo de liderança míope e reativa — justamente o oposto do que se espera de empresas competitivas e socialmente responsáveis.
Responsabilidade que não se terceiriza
Líderes, gestores e empresários têm nas mãos o poder — e o dever — de estruturar políticas de prevenção e acolhimento. Isso inclui programas de escuta ativa, apoio psicológico, capacitação de lideranças para lidar com sofrimento emocional nas equipes, ambientes colaborativos e a valorização de jornadas equilibradas.
O cuidado com a saúde mental é, portanto, o novo divisor de águas entre empresas que evoluem e aquelas que se fossilizam. A pergunta que se impõe aos empresários é clara: sua organização está preparada para o presente ou será lembrada como mais um capítulo dos neandertais corporativos que resistiram à civilização do cuidado?