Um juiz de São Paulo atendeu ao pedido de um dirigente de fundo de pensão e anulou uma decisão administrativa tomada com base no voto de qualidade (ou de Minerva), mecanismo utilizado em casos de empate. O instrumento é alvo de questionamentos porque normalmente é proferido por quem preside o processo de votação e, com isso, equivale a votar duas vezes.
O processo, ligado a investimentos de crédito privado, envolveu um ex-dirigente da Infraprev, fundo de pensão dos funcionários da Infraero. Após julgamento administrativo, ele foi multado pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) em pouco mais de R$ 40 mil.
Ao recorrer da decisão na Câmara de Recursos de Previdência Complementar (CRPC), houve empate entre os conselheiros. O presidente da sessão de julgamento, em voto de qualidade, desempatou em favor da Previc. Descontente com o resultado, o ex-dirigente buscou anular a decisão na Justiça. O decreto 7.123, que dispõe sobre o Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC) e sobre a CRPC, determina que a Câmara será composta por sete membros, e em caso de empate, além do voto ordinário, o presidente deverá proferir o voto de qualidade.
Não se trata de mero voto de desempate, mas de autorização para que um mesmo membro vote duas vezes” — Djalma M. Gomes
Para o juiz Djalma Moreira Gomes, da 25ª Vara Cível Federal de São Paulo, não faz sentido um julgador ter direito a mais de um voto. “O voto de qualidade vai de encontro ao arcabouço normativo que rege a matéria, na medida em que não se trata de mero voto de desempate, mas de verdadeira autorização para que um mesmo membro do órgão colegiado (presidente) vote duas vezes”, diz a decisão, obtida pelo Valor. Segundo o magistrado, o único entendimento compatível com o princípio constitucional da igualdade é a previsão de voto de qualidade ao presidente do órgão colegiado que não chegou a votar ordinariamente.
“O voto de Minerva sempre foi um fantasma por todo mundo que é julgado pelo CRPC. Quando se judicializava isso, havia uma visão legalista de que [o voto de qualidade] estava estabelecido no decreto do CRPC. Pela primeira vez, o magistrado entendeu que ninguém ali poderia votar duas vezes”, afirma o advogado Pedro Vasconcelos, sócio do escritório Balera, Berbel e Mitne Advogados, que atuou no caso.
No ano passado, os irmãos Joesley e Wesley Batista questionaram na Justiça uma decisão do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), o “Conselhinho”, em que foi utilizado o voto de Minerva. Também há discussões sobre o assunto no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
Os advogados que atuam em casos administrativos em que é utilizado o voto de qualidade defendem o princípio do “in dubio pro reo”, utilizado no direito penal. “Esse é um importante precedente para os tribunais relativo às instâncias administrativas federais. Fica bem claro no processo administrativo sancionador que devemos sempre seguir as premissas que são aplicadas no código de processo penal. Havendo aparente impasse do órgão julgador, tem que prevalecer a decisão mais favorável para o acusado”, afirma o advogado Juliano Barra, sócio do Barra, Barros & Roxo Advogados. Procurada, a Previc não comentou.
(Valor Econômico)