Entrevista exclusiva: Mario Povia, ex-diretor da ANTAQ, fala sobre os desafios do comércio exterior, a criação do IBI e as perspectivas para a logística brasileira

Em entrevista exclusiva ao SINDICOMIS NACIONAL, Mario Povia – ex-diretor-geral da ANTAQ, diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Infraestrutura (IBI), engenheiro, consultor e uma das principais referências em infraestrutura portuária e logística no Brasil — analisa os avanços e desafios do comércio exterior, a criação do IBI e as perspectivas para o desenvolvimento logístico do país. Com vasta experiência em regulação, políticas públicas e projetos estratégicos, Povia oferece uma visão qualificada sobre os gargalos históricos e as oportunidades de transformação no setor.

Como e por qual razão o IBI foi criado?

O Instituto Brasileiro de Infraestrutura (IBI) foi criado a partir da instalação da Frente Parlamentar Mista de Portos e Aeroportos (FPPA), na qualidade de braço técnico, por iniciativa do deputado federal Paulo Alexandre Barbosa (PSDB/SP), então recém-empossado em seu primeiro mandato na Câmara dos Deputados.

No ranking global de abertura comercial, o Brasil está atrás de várias economias emergentes. Em sua opinião, o que impede o país de acelerar reformas e acordos que reduziriam barreiras tarifárias e não tarifárias?

Creio que este processo já se iniciou, encontrando-se atualmente em pleno curso. O Brasil é signatário do acordo de facilitação comercial, sendo certo que a própria Receita Federal do Brasil (RFB) vem adotando uma série de medidas tendentes a desburocratizar e promover o intercâmbio comercial do Brasil com outras nações.

Mais recentemente, a autoridade aduaneira anunciou o desenvolvimento de procedimentos de desembaraço de cargas sobre águas, bem como vem realizando testes para implantação da DUIMP (Declaração Única de Importação), medidas que virão simplificar e promover uma nova dinâmica no comércio exterior brasileiro.

De toda forma, particularmente no que se refere às barreiras tarifárias, importa destacar a deterioração de organismos multilaterais constituídos para tal fim, vis-à-vis com os desafios impostos recentemente pelo governo dos Estados Unidos da América (EUA), o que pode vir a trazer relevantes retrocessos nesta seara.

Em sua opinião, por que o Brasil ainda é visto majoritariamente como exportador de commodities? O IBI tem propostas para romper essa dependência?

O Brasil é visto desta forma precisamente porque é um grande exportador de commodities, portanto, a afirmativa revela de certa forma uma realidade, muito embora tenhamos uma pujança industrial, mas que não vem apresentando o desejável crescimento ao longo das últimas décadas.

As reformas da previdência, trabalhista e, mais recentemente, a tributária, tentam resgatar a competitividade perdida pela indústria nacional, assolada por problemas sistêmicos como a histórica alta de juros, o sofrível ambiente de negócios e um sistema tributário perverso e esquizofrênico.

O foco da atuação do IBI é notadamente na infraestrutura de transportes. Acreditamos que criar condições objetivas para que possamos aumentar a produtividade, através da absorção de novas tecnologias e redução de burocracias, é um passo importante para melhor aproveitamento de nossos ativos.

Noutra vertente, lutamos para criar condições tendentes a possibilitar a construção de novas estruturas de forma mais célere, mediante o enfrentamento de gargalos existentes. Cito aqui a morosidade de regularização fundiária por parte da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), bem como a dificuldade na obtenção e manutenção das licenças ambientais, questões que são absolutamente prioritárias na pauta do IBI.

Enquanto economias abertas conseguem processar importações e exportações em horas ou poucos dias, no Brasil o tempo e o custo logístico ainda são entraves relevantes. Quais experiências internacionais o IBI considera mais aplicáveis ao Brasil e o que falta para que essas boas práticas sejam implementadas aqui?

Os problemas são antigos e conhecidos. Para além das dificuldades com burocracia, excesso de intervenção estatal na economia, ausência de provisão de infraestrutura adequada e políticas de governo repaginadas a cada mandato de quatro anos, quando deveríamos ter ações de Estado, contínuas e perenes, não conseguimos dotar nosso comércio exterior de um ambiente de negócios que resulte em menor judicialização de conflitos, afetando o que chamamos de segurança e estabilidade regulatória.

Repito que há uma série de iniciativas em curso, seja na provisão de infraestrutura, na redução de medidas burocráticas, na simplificação tributária, no desenvolvimento de procedimentos extrajudiciais para solução de conflitos. Contudo, sempre temos o risco de sofrer interrupções e retrocessos a cada troca de comando na política.

O nosso modelo de landlord port, por exemplo, se encontra muito distante dos padrões europeus, que seriam nossa principal referência. Entendemos que a governança de nossas autoridades portuárias poderia ser melhor disciplinada. Neste sentido, reporto ao Projeto de Lei nº 733/2025, em trâmite na Câmara dos Deputados, para o qual o IBI fez uma série de propostas visando seu aperfeiçoamento.

Na visão do IBI, a concessão da Hidrovia do Rio Paraguai tem condições reais de se tornar um eixo integrado às cadeias logísticas regionais ou corre o risco de permanecer como um corredor isolado, sem ganhos estruturais para a competitividade do Brasil?

O simples desenvolvimento de algum modal de infraestrutura de transporte já nos remete a potenciais possibilidades de obtenção de sinergias, eis que a logística tende a aproveitar as oportunidades que lhe são oferecidas, visando sobretudo a eficiência econômica e ambiental.

No tramo sul da hidrovia do Paraguai, há efetivamente a possibilidade de conexões para além das ligações com Paraguai e Argentina, lembrando que o Brasil estuda atualmente o desenvolvimento de cinco rotas bioceânicas com vistas ao atingimento do Pacífico, além de possuir uma legislação moderna que permite a construção de trechos ferroviários sob regime autorizativo, com o condão de interligar diferentes modais de transporte.

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