Governo chega ao meio do ano sem comandos efetivos em agências de transporte

O governo fechou o primeiro semestre de 2025 sem conseguir avançar nas sabatinas para resolver o comando das três agências reguladoras na área de transportes. Com isso, ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) são chefiadas por interinos. Em cada órgão, os substitutos chegaram aos postos em circunstâncias diferentes, embora a lei e a AGU (Advocacia-Geral da União) prevejam um procedimento único para esses momentos.

No caso da ANAC, a vacância obrigou o órgão a convocar, na segunda-feira (30), pela segunda vez, um superintendente para exercer o cargo de diretor-presidente substituto – agora, o responsável pelo Acompanhamento de Serviços, Adriano Pinto de Miranda. A chamada foi feita após Roberto Honorato, superintendente de Aeronavegabilidade, ter completado o período máximo permitido de seis meses na cadeira.

Com a troca, a ANAC passou a seguir neste ano a orientação da AGU de fazer a nomeação de interinos a partir de uma lista de substituição aprovada previamente. Ao longo de 2023 e 2024, a agência optou por deixar o diretor Tiago Pereira no comando do órgão interinamente. Até então, ele era o escolhido para substituir oficialmente Juliano Noman, que deixou o cargo de diretor-geral para assumir a SAC (Secretária de Aviação Civil). Com a troca da indicação pelo nome do diretor comercial da Infraero, Tiago Faierstein, no final do ano passado, Pereira deixou a chefia do órgão e hoje atua apenas como diretor.

À Agência iNFRA, a AGU reforçou que sua orientação é de que os diretores-gerais das agências reguladoras sejam substituídos por meio da lista prevista na Lei 13.848/2019. Se a lista não existir, o comando dos órgãos deve ser assumido pelo superintendente mais antigo na agência reguladora, disse a pasta, em nota.

Esse não tem sido, contudo, o procedimento adotado na ANTT e na ANTAQ. Na agência de transportes terrestres, assim como fez a ANAC durante 2023 e 2024, quem assumiu interinamente a chefia da diretoria foi Guilherme Sampaio, diretor nomeado que substituía o então diretor-geral nas ausências dele. Sampaio está indicado desde dezembro do ano passado para ser o novo diretor-geral, mas também não teve o nome aprovado até o momento pelos senadores.

Na ANTAQ, a escolha também foi de colocar um diretor no comando temporário da agência. A diferença é que Caio Farias, que ocupa o posto, não é o indicado pelo governo para ocupar a cadeira efetivamente. A gestão Lula ainda não enviou o nome do escolhido para assumir o comando da agência de transportes aquaviários.

Prazo para ficar
Interlocutores na agência assinalam que a obrigação de o interino ficar no cargo por no máximo 180 dias é restrita ao caso de substituição por servidores. Por essa avaliação, Farias pode permanecer no cargo até o fim do seu mandato, que se encerra em 13 de dezembro de 2027, caso não haja nova indicação por parte do governo federal. A agência foi procurada pela reportagem, mas não respondeu aos questionamentos até o fechamento desta edição.

Segundo fontes, o nome mais cotado para a chefia da ANTAQ é o de Frederico Dias, auditor do TCU (Tribunal de Contas da União). No entanto, Farias trabalha para permanecer no cargo e, se seu nome for confirmado como diretor-geral, Dias deverá ser indicado para a vaga de diretor.

Interino no aguardo por votação
Já na ANTT, Sampaio foi anunciado como o indicado para comandar a agência em dezembro, tendo assumido interinamente a cadeira em 19 fevereiro deste ano. Ele ocupava a posição de diretor da agência desde julho de 2021 e tem o encerramento do mandato previsto para 18 de fevereiro de 2026.

À Agência iNFRA, a ANTT informou que enviou, em abril deste ano, uma nova lista tríplice de substitutos ao Ministério dos Transportes, que, por sua vez, encaminhou o documento à Casa Civil. Os nomes, no entanto, ainda não foram publicados.

De acordo com a agência, o prazo de 180 dias para a permanência na interinidade da diretoria-geral não se aplica ao caso de Sampaio, pois seria contabilizado apenas para membros da lista que não fazem parte da diretoria colegiada. A autarquia afirmou também que a nomeação dos membros da diretoria colegiada da agência segue “rigoroso processo constitucional”.

A indicação de Sampaio está envolta, ainda, em uma disputa entre o Congresso e o governo sobre o tempo que o escolhido deve ocupar o posto. Pela mensagem enviada ao Senado no fim do ano passado, ele ficaria no comando da ANTT somente até o término do seu mandato original como diretor, ou seja, até fevereiro de 2026. Parlamentares cobram que a indicação contemple um novo mandato de cinco anos, mas o entendimento de parte do governo é que a lei não permitiria.

Demora e enfraquecimento
A ausência de diretores titulares nas agências, somada à forte restrição orçamentária vivida por esses órgãos, preocupa os setores regulados e os servidores das autarquias. Nas últimas semanas, intensificaram-se as reclamações sobre o cenário enfrentado pelas agências, o que foi turbinado por anúncios de paralisação de serviços pela falta de recursos.

Na última sexta-feira (27), a ANAC anunciou que pode paralisar até 60% de atividades essenciais para a aviação civil, devido ao corte orçamentário decretado pelo governo federal no final do mês de maio (veja mais no site da Agência iNFRA). Segundo o órgão, caso não haja recomposição do orçamento, as supervisões e inspeções de segurança das operações aéreas serão realizadas em frequência “muito menor do que o previsto nos programas de vigilância continuada”.

Nos bastidores, a avaliação é de que os servidores, temerosos com a situação de instabilidade, já começam a buscar oportunidades na iniciativa privada. Os cortes nas viagens de capacitação, por exemplo, acenderam um alerta no corpo técnico das autarquias.

A UnaReg (Associação Nacional dos Servidores Efetivos das Agências Reguladoras Federais) é uma das entidades que têm alertado para os problemas – gerados tanto pela demora nas indicações quanto pela restrição orçamentária. Em nota enviada à Agência iNFRA, a associação disse que a “morosidade” no processo de indicação e aprovação dos cargos compromete o pleno funcionamento das agências, “enfraquece” a capacidade de atuação e gera impactos negativos diretos para a sociedade e os setores regulados.

“Nos últimos meses, temos assistido às graves consequências dessa omissão, pois a ausência de diretores com mandato impede que as agências reguladoras desempenhem com autonomia real, como na necessária contestação ao absurdo contingenciamento orçamentário imposto. A restrição de recursos desestabiliza o planejamento e a execução de atividades técnicas fundamentais, prejudicando fiscalizações e regulações indispensáveis ao equilíbrio do mercado e à qualidade dos serviços públicos”, completou a UnaReg.

Previsões à frente 
Como já mostrou a Agência iNFRA, a demora na sabatina dos indicados para os cargos de diretores-gerais das agências reguladoras enfraqueceu o poder de articulação das autarquias no Congresso, que ainda não conseguiu dar andamento a projetos que permitam a elas recuperar algum fôlego nos seus orçamentos.

Entre esses está o PLP (Projeto de Lei Complementar) 73/2025, que propõe alterações na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) para excluir as despesas das agências reguladoras federais das limitações de empenho e movimentação financeira. Autor da proposta, o senador Laércio Oliveira (PP-SE) disse à reportagem que tem esperança na tramitação do projeto, mas acredita que será difícil, devido à resistência do Palácio do Planalto.

Oliveira espera que as sabatinas para a aprovação dos indicados ocorram neste mês de julho, já na próxima semana, pois “entendimentos políticos precisam ser consagrados” para que as votações sejam incluídas na pauta. O senador espera que a situação seja resolvida nos próximos dias.

“Funcionamento normal”
Em nota, a ANAC afirmou que não há uma situação de fragilização institucional em razão da vacância do cargo de diretor-presidente e reforçou que, no momento, “aguarda-se a sabatina de três novos diretores, entre eles, o diretor-presidente”.

“A Lei das Agências Reguladoras (Lei nº 13.848, de 25 de junho de 2019) prevê mecanismos para que a ANAC siga com sua composição de diretoria completa e apta a decidir sobre assuntos regulatórios, administrativos e outros. A propósito, durante o período de interinidade, diversos normativos foram aprovados e recursos a multas e processos administrativos foram julgados, o que demonstra o funcionamento normal da agência, mesmo com a presença de substitutos na diretoria colegiada”, disse o órgão.

(Agência iNFRA)

Associe-se

Filie-se

Dúvidas?

Preencha o formulário abaixo e nossa equipe irá entrar em contato o mais rápido possível!